quinta-feira, 2 de outubro de 2025

Jamais houve tantas guerras no mundo, segundo o Relatório anual da UAB

 

A crise no Haiti evoluiu para um conflito armado 


O relatório do Centro de Pesquisa para uma Cultura de Paz da Universidade Autônoma de Barcelona destaca um aumento generalizado de tensões internacionais e guerras no mundo inteiro, com um número crescente de mortes e violações generalizadas de direitos humanos. No entanto, há vislumbres de paz nos quais a comunidade internacional deve investir. A preocupação, contudo, envolve a mudança militarista da União Europeia e seu plano de rearmamento de € 800 bilhões

O relatório anual sobre conflitos, direitos humanos e oportunidades para a paz, feito pelo Centro de Pesquisa para uma Cultura de Paz da Universidade Autônoma de Barcelona, ​​​​registra um aumento sem precedentes de guerras globais nos últimos 12 anos. O documento, baseado em dados divulgados pelas principais agências e organizações internacionais, analisa o estado global dos conflitos armados, tensões sociopolíticas e iniciativas de construção da paz, destacando tendências, riscos e oportunidades para a paz no futuro. Em 2024, o número de conflitos armados aumentou para 37, em comparação com 36 em 2023. A maioria dos conflitos concentra-se na África (17), seguida pela Ásia e Pacífico (10), Oriente Médio (6), Europa (2) e América (2). Dois contextos degeneraram de crise sociopolítica para conflito armado devido ao alto número de vítimas e tiroteios: Haiti e Papua Ocidental, enquanto a Guerra do Sinai, no Egito, deixou de ser considerada como tal.

Aumento de violência e mortes


Cinquenta e sete por cento dos conflitos armados foram de alta intensidade, resultando em graves perdas humanas e impactos na segurança. Além disso, 60% dos conflitos apresentaram aumento da violência em comparação aos anos anteriores. As principais causas incluem a rejeição do sistema político, econômico ou social do Estado (73%), questões de identidade e demandas por autogoverno (59%) e controle de recursos e territórios (46%).

Mulheres na mira

O relatório também destaca os graves impactos de gênero nos conflitos. Em 2024, 79% dos conflitos de alta intensidade ocorreram em países com baixos níveis de igualdade de gênero. Além disso, os casos de violência sexual relacionada a conflitos aumentaram 50% em 2023, com mulheres e meninas representando 95% das vítimas.

Tensões sociopolíticas

As crises sociopolíticas aumentaram, atingindo 116 casos em 2024, com a maioria na África (38) e na Ásia e Pacífico (31). Trinta e oito por cento dessas crises se agravaram em relação a 2023, enquanto apenas 21% apresentaram redução nas tensões. As principais causas incluem oposição às políticas governamentais (77%), questões de identidade (30%) e controle de recursos e territórios (35%).


A paz é possível

Apesar da situação crítica, o relatório identifica cinco oportunidades para a paz: as negociações entre a República Democrática do Congo e Ruanda, a transição política em Bangladesh, o diálogo sobre autonomia em Bougainville, o processo de paz entre a Turquia e o PKK e a esperança de uma nova era pós-Assad na Síria. No entanto, quatro cenários de risco também emergem: a guerra civil no Sudão, as tensões entre a Índia e o Paquistão, o confronto entre a China e Taiwan e a militarização da União Europeia.


A Europa em risco

A União Europeia e seus Estados-membros lançaram um plano de rearmamento massivo – observa o Relatório – com um compromisso financeiro superior a € 800 bilhões ao longo de quatro anos. O plano europeu parece priorizar o setor militar principal para lidar com as atuais tensões geopolíticas, em detrimento de vias não militares para a própria segurança. O Plano surge na sequência do aumento dos gastos militares globais e da pressão da Otan por maiores compromissos financeiros dos Estados-membros. Não por último, o Relatório destaca a capacidade da indústria de armamentos de influenciar o poder político como um dos fatores que impulsionam a Europa rumo ao rearmamento.


https://www.vaticannews.va/pt


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quarta-feira, 1 de outubro de 2025

Brasil coordena capacitação de países do Mercosul em procedimentos de elegibilidade para solicitantes de refúgio

 


O Brasil, no exercício da Presidência Pro Tempore do Mercosul, iniciou, nesta segunda-feira (29), o Ciclo de Capacitação Regional sobre Procedimentos de Reconhecimento da Condição de Refugiado. A iniciativa tem como objetivo fortalecer os sistemas nacionais de refúgio na região para contribuir para a harmonização de critérios e práticas na análise de pedidos de refúgio.

O Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), por meio da Coordenação-Geral do Comitê Nacional para os Refugiados (CG-Conare), conduz o treinamento com especialistas do órgão colegiado, além de representantes do Acnur e das Secretarias Técnicas dos países participantes. A capacitação é voltada a oficiais de elegibilidade e equipes técnicas das secretarias dos Comitês e das Comissões de Refugiados dos países membros e associados do Mercosul.

Por iniciativa do Brasil, o convite foi estendido ao Governo de Angola que, neste mês, fez uma visita técnica de estudos ao Brasil para conhecer o sistema de elegibilidade nacional e a Operação Acolhida. Na ocasião, foram apresentados a estrutura do sistema brasileiro, os procedimentos de análise de pedidos de refúgio e as políticas voltadas à integração dos solicitantes.

O ciclo de treinamento terá formato virtual, em cinco sessões semanais. Serão abordados temas como direito internacional dos refugiados, análise de elegibilidade e aplicação de práticas padronizadas que assegurem maior qualidade, coerência e justiça nos processos de determinação da condição de refugiado. As próximas datas programadas são: 6, 20 e 27 de outubro e 3 de novembro, sempre das 10h às 13h (horário de Brasília). Além disso, está prevista a segunda reunião dos Conares para 13 de outubro.

Integração Regional

A iniciativa é uma ação concreta proposta pelo Brasil para cumprir um dos compromissos assumidos pelos países do Mercosul no âmbito do Fórum Global sobre Refugiados, em dezembro de 2023. O Brasil se comprometeu que, durante a sua Presidência Pro Tempore do País, iria promover a articulação com os países integrantes do Mercosul e seus associados para o fortalecimento do sistema de refúgio. O objetivo é integrar os países da região para construir uma agenda de proteção às pessoas deslocadas de forma forçada.

A coordenadora-geral do Conare, Amarilis Tavares, explicou a relevância da iniciativa para a região. “O Brasil tem buscado exercer um papel de liderança construtiva no Mercosul, compartilhando práticas consolidadas. A capacitação representa uma oportunidade de potencializar capacidades técnicas, mas também de reafirmar o compromisso regional com os direitos humanos e a proteção internacional dos refugiados”, afirmou.

Além da capacitação técnica, a proposta busca aproximar os países da região e fomentar o intercâmbio de experiências. Um dos focos centrais é garantir que as decisões sobre pedidos de refúgio sejam tomadas de forma alinhada às normas internacionais – especialmente a Convenção de 1951, o Protocolo de 1967 e demais instrumentos internacionais e regionais de proteção.

Brasil na Presidência Pro Tempore do Mercosul

A Presidência Pro Tempore do Mercosul é exercida rotativamente pelos Estados Partes, por períodos de seis meses. Durante esse período, o país responsável coordena as reuniões, articula iniciativas conjuntas e representa o bloco em diferentes fóruns internacionais. No segundo semestre de 2025, o Brasil ocupa a função e conduz uma série de ações estratégicas, incluindo a área de migrações e refúgio.

Criado em 1991, o Mercosul (Mercado Comum do Sul) é um dos mais importantes blocos de integração regional do mundo. Ele reúne Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai como membros plenos e outros países associados (Bolívia, Chile, Peru, Colômbia, Equador, Guiana e Suriname). A Venezuela está suspensa. O bloco atua na promoção da integração econômica, política e social. O Mercosul também é um espaço de cooperação em temas de direitos humanos e migrações.

gov.br/mj/pt-br

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terça-feira, 30 de setembro de 2025

Falta de políticas de integração de imigrantes vai empurrá-los para outros países

 


A geógrafa Lucinda Fonseca defendeu que a falta de políticas de integração dos estrangeiros vai empurrar estes quadros para outros países europeus e colocar Portugal como simples ponto de entrada na UE, com necessidades permanentes de imigrantes.

“Nós temos estudos, na questão da mobilidade intra-europeia, em que de todos os tipos de imigrantes que vão para outros países da Europa, seguindo até os passos da emigração portuguesa, por terem dificuldades em se fixar em Portugal”, afirmou à Lusa, a investigadora do Instituto de Geografia e Ordenamento do Território da Universidade de Lisboa.

“Já fiz várias entrevistas. Muitos gostavam de ficar cá, mas vão-se embora”, resumiu a investigadora, que critica a falta de políticas de integração, que deve passar pela fixação de famílias no território nacional.

“Quem tiver cá a família, mais dificilmente pensa em sair”, explicou Lucinda Fonseca, a dois dias do parlamento reapreciar a nova lei de estrangeiros, que dificulta os processos de reagrupamento familiar.

Tem de existir “um investimento do país” nos imigrantes e “não podemos estar aqui a criar guetos” ou a “alimentar situações de exclusão que são prejudiciais para todos”, pelo que é “crítico apostar na aprendizagem da língua”, avisou.

Lucinda Fonseca é uma das autoras do Índice europeu de Políticas de Integração Migratória (Mipex, na sigla inglesa), que incluiu elogios à política portuguesa para imigrantes até 2024, alertando para o risco de “retrocessos legislativos que comprometam a inclusão e a coesão social”.

Em 2024, o Governo PSD/CDS eliminou a manifestação de interesse, um recurso jurídico que permitia a regularização em Portugal de quem tinha entrado com visto de turismo, e o grande afluxo de imigrantes atrasou os processos de reagrupamento familiar, cujas regras o executivo quer apertar ainda mais com a nova lei de estrangeiros, que será reapreciada na terça-feira, após um chumbo, em agosto, pelo Tribunal Constitucional.

A “nova proposta é um bocadinho menos pior do que a anterior, mas continua a ser má”, disse, comentando o novo diploma, proposto pelo Governo, que “já permite o reagrupamento familiar imediato para casais com filhos em comum e a redução para um ano [de autorização de residência], quando há prova de coabitação prévia”.

“Na prática, continua-se a separar as famílias e a dificultar a integração de núcleos que são fundamentais para facilitar o processo de integração”, salientou a investigadora.

A burocracia “está desenhada para dificultar” a fixação de imigrantes em Portugal e “não se dá sinais de abertura, apesar de se saber que a entrada de pessoas é imprescindível para Portugal em termos demográficos e em termos económicos”.

“Portugal precisa de uma política migratória que seja coerente com as suas necessidades demográficas e económicas e que seja alinhada com os direitos fundamentais, portanto, leis restritivas, que desvalorizam a unidade familiar, desincentivam a fixação duradoura dos migrantes não contribuem nem para a coesão social, nem para o crescimento económico”, acrescentou a investigadora.

https://www.mundolusiada.com.br/

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segunda-feira, 29 de setembro de 2025

Cooperativas promovem paz e justiça com inclusão de migrantes e refugiados no Brasil

 


Entre tecidos, linhas e pontos, uma cooperativa de Roraima tem ajudado mulheres venezuelanas a costurar um novo futuro em território brasileiro, com capacitação, trabalho e esperança de recomeço. A atuação da Cooperativa de Empreendimento Econômico Solidário de Boa Vista (Coofecs) é um exemplo de como o cooperativismo brasileiro contribui para o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) 16, da Organização das Nações Unidas (ONU), que trata da promoção da paz e da justiça. 

Esse compromisso global aponta caminhos para sociedades pacíficas e inclusivas, o que inclui a garantia dos direitos dos migrantes, para que essas populações sejam tratadas com dignidade, protegidas da violência e discriminação, e tenham igualdade de acesso à justiça. 

Em parceria com a Organização Internacional para Migrações (OIM Brasil), agência da ONU, a Coofecs acolhe as mulheres venezuelanas no projeto “Empreendedores em movimento”, um curso gratuito de costura básica e industrial. Além de técnicas de reparo, confecção sob medida e produção de peças personalizadas, elas recebem uma máquina de costura no final, aprendem sobre direitos no Brasil e são integradas social e economicamente – conhecimento que as ajuda a costurar novas oportunidades e recomeçar a vida longe de seu país. 

“A cooperativa sempre buscou incentivar a autonomia das mulheres e atualmente, com a migração venezuelana, estamos focando no atendimento prioritário a essa população. Nas nossas turmas de capacitação, por exemplo, temos um profissional para traduzir as aulas e dar suporte a essas mulheres recém-chegadas no Brasil. Em sala de aula, elas são incentivadas a gerar renda para a família, acessar o mercado de trabalho e estudam mais sobre a valorização da mulher nos espaços e sua identidade”, explica a presidente da Coofecs, Maria dos Santos.

ODS16 Coofecs copiar

Segundo dados do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), dos 194.331 imigrantes que  entraram no Brasil em 2024, quase metade (48,7%) eram venezuelanos com solicitações de refúgio. Em Roraima, por onde a maioria dessa população chega ao território brasileiro, a atuação de cooperativas de diversos ramos tem ajudado a atenuar a crise humanitária provocada pelo deslocamento em massa do país vizinho. 

Além de atuar na capacitação profissional de refugiadas, a Coofecs colabora com outras iniciativas de apoio a imigrantes no estado, com ações voluntárias em projetos sociais e doação de alimentos para comunidades vulneráveis. “Nossa atuação na região fortalece os laços sociais e a solidariedade, o que é essencial para a paz e a inclusão”, destaca a gestora. 

Diversidade e propósito 

No oeste do Paraná, 831 imigrantes de diferentes partes do mundo encontraram na Frimesa Cooperativa Central mais do que um emprego. Vindos de países como Argentina, Paraguai, Uruguai, Venezuela, Colômbia, Haiti, Coreia, Senegal, Angola, África do Sul, Cuba, Líbano e Marrocos, eles são acolhidos em um ambiente de trabalho que valoriza a diversidade cultural e promove a integração.

“Cada colaborador, seja brasileiro ou imigrante, é parte essencial da nossa estratégia. Na Frimesa, crescer é gerar valor para todos – sem distinções, com cooperação, respeito e oportunidades reais”, afirma o presidente executivo da cooperativa, Elias José Zydek. 

A Frimesa oferece apoio aos trabalhadores estrangeiros desde a parte burocrática, com suporte documental e auxílio na legalização no Brasil, em parceria com o Centro de Referência de Assistência Social (CRAS). Para promover a integração socioeconômica dos colaboradores, a cooperativa garante salários justos e competitivos, com políticas que reconhecem desempenho e resultados, sem distinção de gênero, raça, religião ou origem.

Em outra iniciativa alinhada ao ODS 16, em busca da justiça e práticas éticas e transparentes, a coop aderiu ao Pacto Empresarial pela Integridade e Contra a Corrupção em 2023. No ano passado, reforçou seu compromisso ao integrar o Pacto Brasil pela Integridade Empresarial e o Pacto Global da ONU – Rede Brasil, consolidando sua postura pública contra a corrupção. 

Cooperativas e paz 

Uma das principais lideranças globais do cooperativismo, o ex-presidente do Sistema OCB e ex-ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, afirma que o modelo cooperativo representa atualmente a maior força de inclusão social e paz no mundo. 

Segundo ele, ao garantir emprego, renda e dignidade, as cooperativas transformam realidades. “A exclusão social gera insatisfação, fomenta revoltas e pode levar ao colapso de sistemas políticos, econômicos e institucionais. Nesse contexto, o cooperativismo surge como uma ferramenta poderosa para reduzir desigualdades e promover a inclusão e a paz”.


Fonte: Sistema OCB com adaptações da MundoCoop

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sábado, 27 de setembro de 2025

A América que se reinventa na dor, na arte e na cultura

 


Acredito que devemos encarar a migração na América Latina de maneira menos crítica e mais natural, com o olhar atento e cuidadoso de quem percebe um movimento cultural acontecendo em mão-dupla. Para além da dor e das crises geopolíticas, o encontro de povos reinventa sabores, sotaques e expressões artísticas. A crise venezuelana, em sua urgência, nos faz lembrar de como a resiliência do continente se manifesta na coragem de criar e se reinventar. Empresto aqui a minha percepção, de forma singela, sobre essa transformação silenciosa que cria, na adversidade, novos caminhos para a formação e o reconhecimento de nossa identidade.

A migração não é apenas um apêndice na história da América Latina, mas um de seus aspectos mais constantes e definidores. Antes mesmo das fronteiras nacionais, hoje devidamente demarcadas, já havia tupis, guaranis, maias, incas e centenas de outros povos em movimento, trocando, guerreando e criando uma diversidade cultural que hoje é nossa herança primeira. O século 20 viu chegar levas de italianos e japoneses, somando-se a fluxos anteriores de espanhóis atraídos pela economia agroexportadora. Já nas décadas mais recentes, testemunhamos o fluxo de bolivianos, cubanos, haitianos e, de forma mais aguda e volumosa, venezuelanos, que reconfiguram o panorama migratório regional. Enxergar esses movimentos apenas pela crise ou pela dor é perder de vista que somos um continente erguido no encontro, por vezes violento, por vezes na irmandade, de mundos distintos.

A chegada de milhares de venezuelanos ao Brasil, Colômbia, Peru e Equador, um contingente que já supera 6,5 milhões de pessoas, colocou à prova os sistemas de saúde, educação e assistência social desses países. É inegável e urgente abordar a vulnerabilidade de crianças fora da escola, profissionais altamente qualificados e subempregados e o drama humano de deixar tudo para trás. No entanto, paralelamente a esses desafios, uma transformação discreta, mas crescente, acontece nas feiras, nas escolas, nas cozinhas e nos ateliês. É a reconhecida e histórica resiliência do povo latino-americano, nosso patrimônio intercultural mais valioso, que se manifesta criando novas formas de ser e estar no mundo.

A arte sempre foi o termômetro sensível desses encontros. Artistas de todo o mundo, muitos deles migrantes ou descendentes, têm usado suas obras para romper estereótipos e materializar a dimensão humana dessa experiência. A exposição itinerante Far From Home (Longe de casa), que esteve em São Paulo em 2018, evidencia bem esse fenômeno. Sob curadoria de Nathalie Duchayne e Eduardo Saretta, a mostra reuniu artistas brasileiros e estrangeiros para homenagear a vida no exílio e discutir o “estar longe de casa” por meio de pinturas, esculturas e instalações. Artistas como o muralista Daniel Melim, o casal de mestres artesãos Dona Magdalena e Seu Valentim, e a joalheira Kika Rufino, residente na Alemanha, trouxeram perspectivas que falam do quão complexo é se reconstruir longe do lar, transformando a experiência da migração em ato criativo e de reinvenção.

Para além das galerias, essa reinvenção é cotidiana e sensível. É o sabor que se transforma, como o do pabellón criollo venezuelano, que ganha um toque brasileiro, enquanto um chef peruano incorpora ingredientes locais à sua ceviche em Bogotá. A culinária, linguagem universal do afeto, torna-se um meio de diálogo e acolhimento. É a língua que se enriquece, como o “portuñol” que nasce espontaneamente nas zonas de fronteira e nas comunidades de migrantes não é uma corrupção do idioma, mas uma solução criativa para a necessidade urgente de comunicação. É a economia que se revitaliza, pois o empreendedorismo imigrante mostra-se um acelerador das economias locais.

Estudos de organismos como a CEPAL (Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe) mostram que os migrantes tendem a apresentar uma taxa de empreendedorismo superior à média da população local. Essa energia não se traduz apenas na abertura de pequenos negócios, como restaurantes, barbearias e lojas especializadas, que atendem tanto à sua comunidade quanto ao público em geral. Ela introduz novos conceitos, serviços e formatos de negócio, diversos do estabelecido, fomentam a concorrência e, em última análise, enriquecem o comércio e a cultura das cidades que os acolhem.

São muitos ainda os campos em que podemos perceber essa sutil reinvenção e amadurecimento de nossa identidade, como na dança, na música, ou na televisão, por exemplo, mas vejo em um campo em especial um desafio e, talvez, a maior oportunidade de consolidar todos esses processos. Falo da educação. A inclusão de crianças e adolescentes migrantes não está só no ato da matrícula. Exige que os sistemas educacionais se adaptem, incorporando a diversidade linguística e cultural como uma riqueza e não como um obstáculo. É necessário combater a xenofobia, formar professores sensíveis às novas realidades e entender que a sala de aula é o espaço perfeito para construir a verdadeira integração. Quando uma criança venezuelana, boliviana ou peruana, indígena ou não, tem a chance de compartilhar sua história e sua cultura com colegas brasileiros, e vice-versa, ambos saem transformados, mais ricos em humanidade e mais conscientes do complexo legado que é a identidade latino-americana.

A lição que fica, penso, não é apenas sobre a capacidade de sobreviver às mudanças, mas sobre a coragem de criar oportunidades. A migração venezuelana, em sua dramaticidade, bate à porta com feridas históricas de nosso continente, mas também aponta para um caminho de superação. Ela nos lembra que a identidade latino-americana não é fixa e purista, mas um processo contínuo de mestiçagem cultural, um “mexido cultural” onde o novo emerge do encontro, por vezes conflituoso, mas sempre criativo, entre diferentes olhares.

A verdadeira provocação que fica é se estamos, como sociedades receptoras, prontos para não apenas assistir, mas para aprender e nos deixar transformar por essa força que chega continuamente? Estamos dispostos a reconhecer que a resiliência do migrante é, no fundo, o mesmo impulso que, há séculos, mantém vivo o grito diverso e insurgente da América Latina? A resposta, talvez, esteja sendo gestada agora mesmo, na feira do Brás (SP), nas praças públicas em todo Brasil, aqui no Memorial da América Latina e nas salas de aula, onde o amanhã se inventa, todos os dias, com sotaques diferentes.



https://memorial.org.br/

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sexta-feira, 26 de setembro de 2025

Programa de acolhida humanitária amplia atendimentos e chega a 1,2 mil beneficiários

 

Programa de acolhida humanitária amplia atendimentos e chega a 1,2 mil beneficiários

O quarto acordo de cooperação para acolhida humanitária foi assinado entre a Secretaria Nacional de Justiça (Senajus), do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), e o Projeto Vila Minha Pátria, nesta quinta-feira (25/9). Com a medida, mais 320 afegãos em situação de vulnerabilidade passam a fazer parte do Programa de Acolhida Humanitária por Patrocínio Comunitário, coordenado pela Senajus, que passa a alcançar mais de 1.200 beneficiários.

Além da organização da sociedade civil Vila Minha Pátria, também são parceiros do programa a Panahgah Associação de Apoio Humanitário Internacional, o Instituto Estou Refugiado e a organização Mais. As instituições são responsáveis por executar as ações conforme o plano de trabalho proposto no âmbito do Edital de Chamamento Público nº 1/2024. A seleção segue aberta à participação de novas organizações.

“O patrocínio comunitário só é possível graças à união entre governo, sociedade civil e organismos internacionais, sem repasse direto de recursos do MJSP, nem custos para os beneficiários”, explica a coordenadora-geral do Comitê Nacional para Refugiados (Conare), Amarilis Tavares.

O perfil dos beneficiários é majoritariamente de pessoas integrantes de famílias com crianças, que viviam em países vizinhos ao Afeganistão – algumas delas já com parentes residentes no Brasil. Também fazem parte do grupo outros públicos prioritários, como pessoas com deficiência, LGBTQIA+ e idosos.

Acolhimento e integração

Cada grupo acolhido passará por um período de seis a oito meses nas instalações da instituição, em Morungaba (SP). Durante esse tempo, receberá moradia digna, alimentação, atendimento de saúde, apoio psicossocial e acompanhamento social. O plano prevê também apoio para a emissão de documentos essenciais, como CPF, Carteira de Trabalho e Registro Nacional Migratório. Isso facilitará o acesso a serviços públicos.

Crianças e adolescentes também terão matrícula garantida na rede pública local e aulas de reforço em português. Para adultos, estão previstos cursos de português como língua de acolhimento, capacitação em informática e atividades de preparação para o mercado de trabalho.

Após a etapa inicial, as famílias poderão ser reassentadas em outras cidades brasileiras, em parceria com organizações e comunidades locais. Nessas localidades, terão suporte para integração comunitária, acesso a equipamentos públicos e inserção no mercado de trabalho. O objetivo é proporcionar autonomia e recomeço seguro para os beneficiários.

Vila Minha Pátria

Desde 2022, a Vila Minha Pátria já acolheu mais de mil migrantes, principalmente afegãos, além de iranianos, paquistaneses e palestinos repatriados da Faixa de Gaza. A instituição mantém articulação com órgãos públicos, organismos internacionais como Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (Acnur) e a Agência ONU para as Migrações (OIM), e empresas privadas que oferecem oportunidades de emprego e apoio social.

https://agenciagov.ebc.com.br/

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quinta-feira, 25 de setembro de 2025

Encontro Cultura Viva Comunitária no Mercosul destaca boas práticas e fortalece integração regional

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Foto: Yair Romero

Nesta terça-feira (23), representantes do Brasil, Chile e Peru se reuniram virtualmente no Encontro Cultura Viva Comunitária no Mercosul: boas práticas. A atividade, transmitida pelo canal oficial do MinC no YouTube, buscou compartilhar experiências comunitárias reconhecidas como referência em seus países e fortalecer a integração cultural da região.

O encontro reforçou o conceito de “cultura viva comunitária”, expressão que surgiu a partir da experiência brasileira dos Pontos de Cultura, criados em 2004 e transformados em Política Nacional de Cultura Viva em 2014. O modelo inspirou iniciativas semelhantes em diversos países latino-americanos, como Argentina, Peru, Costa Rica, Uruguai, Paraguai e Chile, consolidando-se como um marco de transformação social e de valorização da diversidade cultural.

Durante as apresentações, representantes dos países compartilharam experiências de organizações culturais comunitárias que atuam em territórios locais, fortalecendo a educação, a comunicação popular, as expressões artísticas e os saberes tradicionais. Essas práticas mostram como a cultura pode ser um elo fundamental para a transformação social, especialmente em comunidades em situação de vulnerabilidade.

Na abertura, a secretária de Cidadania e Diversidade Cultural do Ministério da Cultura, Márcia Rollemberg, contextualizou a reunião e ressaltou o papel do Brasil na construção de políticas culturais comunitárias. Segundo ela, o encontro tem como objetivo trocar boas práticas entre os países do Mercosul, com destaque para experiências do Brasil e Chile.

Márcia enfatizou a dimensão territorial e a importância de políticas nacionais de base comunitária, associando a Política Nacional de Cultura Viva à Política Aldir Blanc de financiamento. “A Cultura Viva é uma política afirmativa de direitos culturais, que junto com a Política Nacional Aldir Blanc, que traz o financiamento, acaba por reforçar todos esses direitos”, explicou.

O Brasil tem hoje 8 mil Pontos de Cultura certificados no Cadastro Nacional, coordenado pelo Ministério da Cultura, abrangendo mais de 1.600 municípios. Para garantir o fortalecimento dessa rede, a Política Nacional Aldir Blanc de Fomento à Cultura destinou um piso de investimento anual para a Cultura Viva de, pelo menos, R$ 400 milhões. Os recursos são repassados pelo MinC para os entes federados aplicarem em suas respectivas redes de Cultura Viva.

“A Cultura Viva promove e amplia direitos, democratiza a promoção, e torna mais forte a diversidade cultural, né? E posiciona a cultura e a criatividade como vetores de transformação social e econômica nos territórios”, afirmou.

A secretária também destacou o papel dos Pontões de Cultura, responsáveis por articular redes de pelo menos cinco pontos, em áreas temáticas diversas como cultura digital, direitos humanos, juventude, povos indígenas, acessibilidade e cultura alimentar. Além disso, ela lembrou da valorização dos mestres e mestras das culturas tradicionais, que em 2025 terão 1.696 bolsas e premiações asseguradas.

Representando o Chile, Jenn Piña, presidenta da Brigada Migrante Feminista, compartilhou a experiência da organização fundada em 2017, composta por mulheres e dissidências sexuais migrantes de países como Venezuela, Argentina e Colômbia. O grupo atua na criação de redes de apoio e cuidado para comunidades migrantes, com foco em mulheres e dissidências sexuais e de gênero, sempre a partir de uma perspectiva decolonial.

Para Jenn, a migração deve ser valorizada como parte fundamental da história dos povos latino-americanos. “A migração é ancestral, faz parte da memória dos nossos povos”, assegurou.

A Brigada tem utilizado a arte como ferramenta de mediação cultural e resistência, com iniciativas como “Cartografías en tránsito” e “Raíces en resistencia”, que unem cartografia têxtil, artes cênicas e expressões visuais para visibilizar as vivências e reivindicações das comunidades migrantes.

Além da arte, o grupo também aposta na criação de espaços de cuidado, especialmente voltados às infâncias, e na valorização da espiritualidade e ancestralidade. Jenn lembrou ainda que a migração desafia a ideia de uma única cultura, ressaltando as raízes indígenas, negras e afrodescendentes da região.

“O racismo, em vez de nos separar, pode ser enfrentado com práticas antirracistas que nos convidam a dialogar entre as diversidades culturais que nos compõem”, completou.

O responsável pela Direção de Artes do Ministério da Cultura do Peru, Eddy Ricardo Ulloa Martinez, apresentou o histórico da política de Pontos de Cultura em seu país, iniciada em 2011 e inspirada no modelo brasileiro. Em 2016, foi promulgada a Lei de Promoção de Pontos de Cultura, resultado da articulação entre governo e sociedade civil.

Segundo Ulloa, a iniciativa busca ampliar o acesso aos direitos culturais, especialmente para populações em situação de vulnerabilidade, como crianças, idosos, migrantes, afrodescendentes e povos originários. “Esta iniciativa nasceu em 2011 com o objetivo de ampliar o exercício dos direitos culturais em nível comunitário, com ênfase especial em populações em situação de vulnerabilidade”, enfatizou.

Atualmente, o Peru conta com 803 organizações reconhecidas como Pontos de Cultura, mais da metade delas fora da capital Lima. Destas, 21% já receberam financiamento por meio de editais, enquanto 60% participaram de processos de capacitação. O impacto é amplo: os Pontos de Cultura já movimentaram mais de 5 milhões de soles, envolveram 10 mil trabalhadores culturais, firmaram mais de 2 mil parcerias e alcançaram quase 400 mil pessoas em todo o país.

O programa se estrutura em quatro mecanismos principais: protagonismo e visibilidade, financiamento por editais, capacitação e intercâmbio, e monitoramento contínuo. Além disso, promoveu encontros nacionais e regionais, regulamentação específica e alternativas de apoio durante a pandemia.

O dirigente ressaltou ainda a importância de avaliar a política após mais de uma década de implementação: “é importante que depois de dez anos possamos avaliar como os mecanismos vêm sendo implementados e como poderão ser melhorados”.

Entre os próximos passos, Eddy destacou a necessidade de ampliar os mecanismos de financiamento, fortalecer a geração de evidências sobre o impacto dos Pontos de Cultura e fomentar pesquisas acadêmicas que embasem o reconhecimento da política como estratégia central para o desenvolvimento comunitário no país.

Márcia Rollemberg detalhou a importância das políticas de cultura viva de base comunitária como eixo estruturante das sociedades latino-americanas. Para ela, os avanços observados nos países do continente reforçam o papel da cultura como promotora de cidadania e identidade.

“A importância desse trabalho está justamente em conectar os fazedores de cultura para além dos governos”, relatou.

A secretária também comentou sobre a necessidade de proteger o patrimônio imaterial e valorizar os saberes tradicionais: “que a gente possa estar fazendo uma proteção com relação a essas pessoas, seus saberes, e contribuindo para garantir a salvaguarda desse patrimônio que nos faz América Latina, que nos traz identidade”, finalizou.

Com um olhar voltado ao futuro, a representante da SCDC incentivou a participação dos países em fóruns internacionais como a Mundiacult e a COP 30, onde espera que novos pactos fortaleçam a cooperação cultural no campo global.

https://www.gov.br/cultura/pt-br

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quarta-feira, 24 de setembro de 2025

Pesquisa sobre migrantes e refugiados iniciada em Roraima ganha projeção internacional

Josué Santos, pesquisador roraimense, leva estudo sobre migração e refúgio da Amazônia para Stanford

 Um estudo iniciado em Roraima sobre migração e refúgio ultrapassou fronteiras e agora terá continuidade nos Estados Unidos. O pesquisador roraimense Josué Santos, egresso do mestrado em Segurança Pública, Direitos Humanos e Cidadania da Universidade Estadual de Roraima (UERR), embarca na próxima semana para a Universidade de Stanford, na Califórnia, onde aprofundará sua investigação.

O trabalho faz parte de seu doutorado em Educação na Universidade de São Paulo (USP), no modelo conhecido como “doutorado sanduíche”, em que parte da pesquisa é realizada no Brasil e parte no exterior.

A trajetória de Josué começou com sua dissertação sobre crianças indígenas venezuelanas da etnia Warao vivendo em abrigos humanitários em Boa Vista. Intitulada Entre Idas e Vindas: Os Processos de Aprendizagem de Crianças Indígenas Venezuelanas Warao Refugiadas e Migrantes em Roraima, na Amazônia, a pesquisa vai se transformar em livro a ser lançado ainda este ano pela UERR Edições.

Além disso, o pesquisador criou a página “Povos Indígenas de Roraima”, que reúne informações sobre organização social e aspectos linguísticos das etnias locais.

Reconhecimento acadêmico

Em 2022, Josué apresentou nos Estados Unidos o artigo Da cabana de palha aos muros de concreto: um estudo comparativo do ensino de português em dois contextos indígenas amazônicos, durante o XI Encontro Mundial sobre o Ensino de Português, promovido pela American Organization of Teachers of Portuguese (AOTP).

Agora, em Stanford, ele pretende ampliar o olhar para os fluxos migratórios de latinos nos EUA, dialogando com sua pesquisa sobre os refugiados na Amazônia.

Para custear os primeiros 30 dias nos Estados Unidos, o pesquisador lançou uma campanha online de financiamento coletivo. Após esse período, ele receberá uma bolsa para ajudar nas despesas de moradia e alimentação.

roraimanarede.com.br

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domingo, 21 de setembro de 2025

Prefeitura de Barreiras promove formação sobre direitos humanos, migração e combate ao trabalho escravo

 

A Prefeitura de Barreiras, por meio da Secretaria Municipal de Assistência Social e Trabalho, realizou na última quarta-feira (17) a formação “Construindo Diálogos”, voltada para a defesa dos direitos humanos, a proteção da população migrante e o enfrentamento ao trabalho análogo à escravidão. A atividade reuniu representantes de órgãos públicos, sociedade civil e organizações parceiras.

Promovida em parceria com o Centro Aplicado de Direitos Humanos (CADH), a ação contou ainda com o apoio da Fundação Pan-Americana para o Desenvolvimento (PADF) e da ELO Consultoria. O objetivo foi integrar a rede de assistência social e ampliar a qualificação técnica dos profissionais para garantir atendimento humanizado a pessoas em situação de vulnerabilidade.

Na abertura, a secretária de Assistência Social e Trabalho, Ivanete Bastos, ressaltou a relevância do encontro para a construção de uma cidade mais justa e inclusiva. “Momentos como este reforçam nosso compromisso em construir uma rede de proteção mais eficaz, capaz de garantir dignidade, inclusão e oportunidades para todos”, destacou.

A programação contou com palestras de especialistas do CADH. Pela manhã, Lavínia Vasconcelos e Vítor Magalhães abordaram direitos humanos e migração, discutindo conceitos fundamentais, marcos legais e os principais desafios enfrentados pela população migrante, além de questões práticas como documentação e acesso a serviços. À tarde, a diretora-geral do CADH, Márcia Figueiredo, apresentou dados sobre tráfico de pessoas e trabalho escravo, ressaltando o papel essencial da assistência social no acolhimento e encaminhamento das vítimas.

O encontro foi encerrado com a reafirmação do compromisso da Prefeitura de Barreiras e dos parceiros em promover cidadania, enfrentar violações de direitos e fortalecer políticas públicas inclusivas, com atenção especial às demandas da população migrante.

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sexta-feira, 19 de setembro de 2025

Discutindo a migração forçada no Vaticano: Papa Leão XIV e ACNUR

 

O Alto Comissário da ONU para Refugiados, Filippo Grandi, foi recebido no Vaticano pelo Papa O Alto Comissário da ONU para Refugiados, Filippo Grandi, foi recebido no Vaticano pelo Papa Leão XIV  (@VATICAN MEDIA)

Leão XIV  (@VATICAN MEDIA)

No dia 18 de setembro de 2025, o Vaticano sediou um importante encontro entre o Papa Leão XIV e Filippo Grandi, Alto Comissário das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR). Os líderes abordaram temas críticos relacionados à migração forçada, ao triste destino das vítimas de guerra e às condições devastadoras em áreas afetadas por conflitos. Neste encontro, Leão XIV reafirmou seu compromisso com a defesa dos direitos humanos e da dignidade das pessoas, especialmente em tempos de crise.

A importância do diálogo entre a Igreja e a ONU

O encontro entre o Papa e Filippo Grandi simboliza um esforço conjunto para aumentar a conscientização sobre a migração forçada e as crises humanitárias que afetam milhares de vidas ao redor do mundo. Desde o início de seu pontificado, Leão XIV tem falado sobre a necessidade de defender aqueles que não têm voz e que são impactados por conflitos e guerras, como os que acontecem em Gaza, Ucrânia, e Mianmar. Grandi destacou a relevância da posição do Papa e o interesse da Santa Sé em crises que muitas vezes são esquecidas ou negligenciadas pela comunidade internacional.

Crises globais e o papel do ACNUR

Filippo Grandi expressou seu otimismo sobre o encontro com o Papa, ressaltando a preocupação compartilhada com as crises globais. O Alto Comissário afirmou que o compromisso de Leão XIV com a questão dos refugiados e migrantes é evidente e crucial para buscar soluções eficazes. Durante a reunião, Grandi mencionou diferentes crises que envolvem a migração, desde o Oriente Médio até a América Latina. Ele fez ainda uma observação sobre a situação da migração no continente latino-americano, afirmando que o Santo Padre possui um conhecimento profundo sobre a realidade da região.

Preocupações com a política migratória dos EUA

Um dos pontos centrais discutidos foi a preocupação do Papa com a política migratória dos Estados Unidos. No recente lançamento do livro “Leão XIV: cidadão do mundo, missionário do século XXI” no Peru, o Papa expressou suas apreensões sobre a postura dos EUA em relação à migração. Grandi destacou que a redução significativa da ajuda humanitária norte-americana tem impactos diretos sobre as operações do ACNUR e outras organizações que tiveram que reavaliar seus esforços diante da nova realidade.

Grandi mencionou que a redução de apoio financeiro não é um problema isolado do governo americano, mas um fenômeno que se repete em vários países europeus, como Alemanha, França e Reino Unido. Essa diminuição da ajuda, segundo Grandi, é contrária aos esforços para reduzir a pressão migratória nas fronteiras de países que recebem refugiados.

Os efeitos da redução da ajuda humanitária

Os impactos da diminuição da ajuda humanitária foram um tema recorrente no encontro. Grandi expôs que, enquanto os países desenvolvidos clamam pela redução da migração, suas ações de corte na ajuda internacional apenas agravam a situação nos países de origem dos deslocados. Tomando como exemplo o Chade, onde a assistência americana anteriormente respondia por mais da metade da ajuda internacional, a redução atual resulta em um quadro ainda mais desesperador para aqueles que buscam escapar de conflitos.

O Alto Comissário afirmou que os traficantes e exploradores de seres humanos já atuam na região, convencendo pessoas a se deslocarem para a Líbia, o que aumenta a preocupação com a segurança e a vida dos migrantes. Ele concluiu ressaltando que a redução da ajuda, além de seus impactos humanitários, é também prejudicial aos interesses dos Estados, que desejam controlar a migração.

Um apelo à comunidade internacional

Com a análise da situação em debate, tanto o Papa Leão XIV quanto Filippo Grandi chamaram a atenção da comunidade internacional para a necessidade urgente de um comprometimento renovado em prol dos direitos dos refugiados e migrantes. A união e a ação efetiva são fundamentais para enfrentar as crises de forma a garantir uma vida digna a todos, independentemente de sua origem ou condição. O encontro no Vaticano ressoou como um forte apelo por solidariedade e ação entre os governantes e a sociedade civil ao redor do mundo.

Esperamos que discussões como essa no seio da Igreja e das organizações internacionais continuem a promover sinais de esperança e ação em prol dos que mais necessitam. Com a sensibilidade da liderança papal e o trabalho incansável do ACNUR, a luta pelos direitos dos deslocados pode ser reforçada e apoiada.

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